Por Tânia Barroso
Outro dia entrei num restaurante, aqui pertinho de casa. Bom padrão. Fiquei curiosa de ver tantos aparelhos de TV. Imaginei terem sido colocados ali por conta da Copa . Jogos em hora de almoço ou em final de tarde, um choppinho pra acompanhar…
Mas a Copa terminara há uns quinze dias. Estavam com som muito alto. Pensei em alguma nova tragédia. Sentei e, antes mesmo de pedir o cardápio, olhei para a TV. Aliás quase todos olhavam, os poucos que não, obrigatoriamente ouviam seu som.
Era o jornal do almoço. Fiquei observando as pessoas. Entre uma garfada e outra, quase nenhum olhar desviava da TV. Não se contemplava o sagrado alimento. Mal se admirava o colorido das folhas verdes contrastando com o tomate vermelho, o ovo branco e amarelo… Ofertas da natureza.
Pior eram os movimentos dos olhos e as feições do rosto. Franziam-se, enrrugavam-se, fechavam-se. Bocas permaneciam entreabertas. Não pela expectativa da comida, mas pelo espanto com a notícia.
Chamei o garçom e perguntei-lhe se não poderiam desligar as Tvs e colocar uma música gostosa, suave. Ele não se conteve e riu. Não riu pra mim. Riu de mim.
Pedi-lhe que, pelo menos, diminuisse o som. Não lhe disse. Mas, se risse mais uma vez, levantaria silente e iria almoçar em casa. Dessa vez, atendeu meu pedido.
Refleti, então, sobre o fenômeno que ocorre atualmente. Por exemplo, há um programa novo, que irá ao ar por esses dias, anunciado em cartazes pela rua: “Tudo pela audiência”. Havia, num passado próximo, mais respeito ao telespectador. Agora… Revela-se, até no título do programa, o real objetivo da TV. Audiência.
Ainda há quem não entenda bem o que é isso. Não sabe que audiência atrai anunciantes que pagam mais . Pagam mais porque mais gente vai ver seus produtos nos comerciais. Mais gente conhecendo seus produtos pela TV vai comprar mais. O que dará a esses anunciantes maior lucro.
Não podemos nos deixar enganar com isso. O sistema capitalista define o lucro como o fator mais importante. É fato. Portanto nada mais importa . Muito menos o telespectador e sua saúde. Aliás, outro dia, vi no dicionário Priberam a definição de saúde: “Estado de bem estar físico, mental e psicológico.” Penso que isto já é difícil de se obter. Mas, contribuir com ações voluntárias que vão contra esta busca… é ilógico, pra mim.
A audiência é alta. Muita gente assiste. E então?
Lembro do grande mestre Ariano Suassuna, que agora zela por nós lá do céu, que contou a seguinte história: Conversava com um amigo enquanto observavam um cachorro que roía um osso, com o maior prazer do mundo. Disse ao meu amigo que achava curioso como os cachorros gostavam de osso. O amigo discordou. Disse que isso só acontecia porque não lhe davam filé. Colocassem um pedaço de filé e um osso, lado a lado, e veríamos do que realmente o cachorro gostava. E concluiu sua afirmativa dizendo que está na hora de se oferecer filé ao povo brasileiro. Chega de osso!
Nosso grande educador Rubem Alves, que foi chamado à mesma festa no céu pra onde foi Suassuna, diz que o objetivo da educação é aumentar as possibilidades de prazer e alegria.
Será que não fomos bem educados?
Tá na hora de pedirmos filé. Nós merecemos.
A mídia fala tanto em legitimidade de manifestações, mas sem violência. Eu pergunto: não é uma violência ela entrar em nossas casas, a qualquer hora, mostrando só degradação, que nos comove, entristece, enfraquece, nos faz sentir impotentes, empobrece o espírito, inibe criatividade, chegando a matar o prazer e a alegria?
Tente lembrar de uma coisa bem bacana que você assistiu ontem na TV.
Inverno de 2014
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